sábado, dezembro 22, 2007

A (In)Significância da Vida


(O seguinte texto, apesar de longo e talvez mórbido/tristonho – tendo em conta a época em que estamos – pretende dar-vos a conhecer alguns casos que vou presenciando no meu dia-a-dia e mostrar-vos a importância que cada um dá á sua própria vida…):

#Jovem de 31 anos que ao sair do trabalho é vitima de atropelamento. Avaliação clinica: múltiplas fracturas dos ossos do cranio, face, fractura membros superiores, fractura da coluna com secção total da medula (ficaria para sempre numa cadeira de rodas, senao mesmo numa cama devido às complicações cerebrais), fracturas membros inferiores. Tem edema da face e um edema cerebral grave. Vai ao bloco operatório e nesse mesmo dia vai para dador de órgãos.

#Criança de 3 anos de idade. Durante um passeio, um carro despista-se e embate na criança que ia a passear ao colo de um familiar, pelo passeio. O familiar tem uma fractura da perna. A criança dá entrada inconsciente, com fractura da bacia, membros inferiores e com evisceração do intestino (intestino fora da cavidade abdominal). Foi ao bloco operatório e faleceu no dia.

#Jovem de 29 anos de idade, chega ao serviço de urgência por tentativa de suicidio. Tentou cortar os braços na região do sangradouro, mas como doeu muito e saiu muito sangue, desistiu. Passado um mês volta por ter cortado os pulsos. Ficou internado no serviço de psiquiatria.

#Recordo uma doente com neoplasia do utero. Sujeita a inúmeros tratamentos sem sucesso. Apresenta edema acentuado e incapacidade funcional dos membros inferiores. Apresenta um cheiro nauseabundo. Durante a prestação de cuidados, pede desculpa pelo seu cheio. Sente envergonhada por cheirar assim. Futuro? É só esperar que um dia o seu sofrimento acabe, através do seu falecimento.

#Jovem de 15 anos, discute com o pai porque este a impede de namorar com um rapaz 16 anos mais velho que ela. Solução? Tentativa de suicidio.

#Jovem de 33 anos, com desconhecimento do porque, ingere voluntariamente um produto quimico altamente mortal. Desfecho: faleceu.

#Jovem de 16 anos: no inicio deste ano é detectado algo a nivel cerebral, isto porque subitamente começou com crises epiléticas. Andava em estudo pela especialidade de neurologia. Um dia, já em Outubro, estava em casa quando começou inesperadamente com dificuldade respiratória. Entra no hospital, mas para a sala de reanimação. Inconsciente, ventilado, sem actividade cerebral. Passado um, dois dias, após confirmada morte cerebral, é desligado o ventilador.

#Homem de seus 50 e muitos anos, tentativa de suicidio, ingere esse mesmo liquido. Uma quantidade minima deste produto é o suficiente para matar. As alterações que provocam são devastadores. É uma morte sofrida. Lentamente os vasos sanguineos vao rebentando, provocando hemorragias. Ao fim de se fazer toda a terapêutica possivel para estas situações, já não para “curar” mas para promover alguma qualidade, os médicos decidem parar com tudo. Já não há nada mais que possa ser feito. Este homem entrou numa tarde. São 04h da manhã. Ele torce-se todo com dores, má disposição. Está numa agitação impressionante. Por entre toda aquela agitação, houve-se uma palavras. Está a rezar. Pede ajuda a Deus para que o ajude a sobreviver, prometendo que nunca mais voltará a fazer o mesmo. Pois bem, já não tem a sua segunda hipótese…

22h, vou a entrar para fazer noite. Á minha frente tenho uma familia que chora muito possivelmente pela perda de um seu familiar. Fico com um nó no coração e prossigo em frente. Tento não ficar muito "perturbada" porque afinal “temos de ser fortes” e penso no que me espera esta noite... Também nós temos de aprender a lidar com estas situações. Muitas delas vêm connosco para casa e consomem um pouco de nós.

A facilidade com que uns acham a vida insignificante e tentam acabar com ela e a facilidade com que outros, sem oportunidade de escolha a perdem, muitas vezes de forma injusta. Crianças, jovens, adultos e idosos, que pelas mais diversas adversidades que encontram, subitamente perdem a sua vida de uma forma rápida, por vezes dolorosa e sem terem hipóteses de escolha.
Será que alguém pensa que de um minuto para o outro podemos não estar cá para contar históra? Mesmo mortos, enterrados e que depois tudo termina de vez sem haver uma segunda oportunidade? Já dizem os mais velhos, a única coisa que não tem solução é a morte e mesmo assim alguns procuram-na. Será que vale a pena preocuparmo-nos tanto com certas coisas, discussões quando o final é o mesmo para todos? Quantas familias irão passar este Natal com o lar incompleto? Deixo-vos a reflectir no tema.

Bom Natal e Feliz Ano Novo para vocês e para todos aqueles que passam/passaram maus momentos…